Tuesday, August 22, 2017

Teses gerais sobre a Questão do Oriente (V.I. Lenin, 1922)

Teses gerais sobre a Questão do Oriente (V.I. Lenin, 1922)


Em celebração ao centenário da Grande Revolução Socialista de Outubro na Rússia (1917), dirigido pelo Partido Comunista (bolchevique) da Rússia, sob a chefatura do grande Lenin.

I
O crescimento do movimento operário no Oriente
Baseando-se na experiência da edificação soviética no Oriente e no crescimento dos movimentos nacionalistas revolucionários nas colônias, o Segundo Congresso da Internacional Comunista fixou a posição principal do conjunto da questão nacional e colonial em uma época de luta a longo prazo entre o imperialismo e a ditadura do proletariado.
Posteriormente, a luta contra o jugo imperialista intensificou-se consideravelmente nos países coloniais e semicoloniais, sobre o terreno do aprofundamento da crise política e econômica do imperialismo do pós-guerra.

Os fatos seguintes o provam: 1º, o fracasso do tratado de Sevres, que tinha por objetivo o desmembramento da Turquia e a restauração da autonomia nacional e política desta; 2º, um forte recrudescimento do movimento nacionalista e revolucionário na Índia, na Mesopotâmia, no Egito, em Marrocos, na China e na Coréia; 3º, a crise interna sem saída em que o imperialismo japonês está comprometido, crise que provocou o rápido incremento dos elementos da revolução democrático-burguesa e a passagem do proletariado japonês para uma luta de classes autônoma; 4º, o despertar do movimento operário em todos os países orientais e a formação de partidos comunistas em quase todos esses países.
Os fatos mencionados são um indício da modificação na base social do movimento revolucionário das colônias. Esta modificação provoca uma intensificação da luta anti-imperialista, cuja direção, assim, não pertence mais exclusivamente aos elementos feudais e à burguesia nacionalista que estão dispostos a comprometerem-se com o imperialismo.
A guerra imperialista de 1914-18 e a longa crise do capitalismo, sobretudo do capitalismo europeu, que a esta seguiu, debilitaram a tutela econômica das metrópoles sobre a colônia.
Por outro lado, as mesmas circunstâncias que tiveram por resultado um estremecimento da base econômica e da esfera de influência política do capitalismo mundial, acentuaram ainda mais a competição capitalista em torno das colônias, provocando uma ruptura de equilíbrio em seu conjunto, do sistema capitalista mundial (luta pelo petróleo, conflito anglo-francês na Ásia Menor, rivalidade japonesa-americana pelo domínio do Oceano Pacífico, etc).
Precisamente, esse enfraquecimento da influência do capitalismo sobre as colônias, ao mesmo tempo que a rivalidade crescente dos diversos grupos imperialistas, é o que facilitou o desenvolvimento do capitalismo nativo nos países coloniais e semicoloniais. Esse capitalismo já sobrecarregou e continua sobrecarregando o marco estreito e importuno do domínio imperialista das metrópoles. Até agora, o capital das metrópoles insistia em querer monopolizar a mais-valia da exploração comercial, industrial e fiscal dos países atrasados, tentando isolá-los da circulação econômica do resto do mundo. A reivindicação de uma autonomia nacional e econômica levantada pelo movimento nacionalista colonial é a expressão da necessidade de um desenvolvimento burguês sentido por estes países. O progresso constante das forças produtivas nativas nas colônias encontra-se, assim, em contradição irreparável com os interesses do capitalismo mundial, pois a própria essência do imperialismo implica a utilização da diferença de nível que existe no desenvolvimento das forças produtivas dos diversos setores da economia nacional, com o objetivo de assegurar a totalidade da mais-valia monopolizada.
II
As condições da luta
O caráter atrasado das colônias manifesta-se na diversidade de movimentos nacionalistas revolucionários dirigidos contra o imperialismo e reflete os diversos níveis de transição entre as correlações feudais, feudal-patriarcais e o capitalismo. Esta diversidade confere um aspecto particular à ideologia destes movimentos.
Nestes países, o capitalismo surgiu e desenvolveu-se sobre uma base feudal, tomou formas incompletas, transitórias e bastardas, que deixam a preponderância, especialmente, ao capital comercial e usurário (Oriente muçulmano, China). Desta maneira, a democracia burguesa toma uma via desviada e complicada para diferenciar-se dos elementos feudal-burocráticos e feudal-agrários. Tal é o principal obstáculo para o êxito da luta contra o jugo imperialista, pois o imperialismo estrangeiro não deixa de transformar, em todos os países atrasados, a camada superior feudal (e em parte semifeudal, semiburguesa) da sociedade nativa, em instrumentos de sua dominação (governos militares ou toukoiuns na China, burocracia e aristocracia na Pérsia, arrendatários de terra, zemindares e talukdars na Índia, colonos de formação capitalista no Egito, etc).
Por outro lado, as classes dirigentes destes países coloniais e semicoloniais não têm nem a capacidade nem o desejo de dirigir a luta contra o imperialismo, à medida que esta luta se transforma em um movimento revolucionário de massas. Somente em lugares onde o regime feudal-patriarcal não se decompôs de forma suficiente, para separar completamente as altas camadas nativas das massas do povo, como, por exemplo, entre os nômades e os seminômades, os representantes destas altas camadas podem assumir o papel de guias ativos na luta contra a opressão capitalista (Mesopotâmia, Mongólia, Marrocos).
Nos países muçulmanos, o movimento nacional encontra sua ideologia a princípio nas consignas político-religiosas do pan-islamismo, o que permite aos funcionários e aos diplomatas das metrópoles utilizar os prejuízos e a ignorância das multidões populares para combater este movimento (é assim que os ingleses jogam com o pan-islamismo e o pan-arabismo, declarando querer transportar o Califado para a Índia, etc. e o imperialismo francês especula com as “preferências muçulmanas”). Porém, à medida que se engrandece e amadurece o movimento de emancipação nacional, as consignas político-religiosas do pan-islamismo são substituídas por reivindicações políticas concretas. O que confirma isso é a luta iniciada recentemente na Turquia para tirar do califado seu poder temporário.
A tarefa fundamental, comum a todos os movimentos nacional-revolucionários, consiste em realizar a unidade nacional e a autonomia política. A solução real e lógica desta tarefa depende da importância das massas trabalhadoras, que este ou aquele movimento nacional saiba separar em seu caminho, depois de ter rompido todas as relações com os elementos feudais e reacionários e levando em seu programa as reivindicações sociais das massas.
Dando-se muito bem conta de que nas diversas condições históricas os elementos mais variados podem ser os representantes da autonomia política, a Internacional Comunista sustenta todo movimento nacional-revolucionário dirigido contra o imperialismo. Porém, a Internacional Comunista ao mesmo tempo não perde de vista que somente uma linha revolucionária consequente baseada na participação das grandes massas, na luta ativa e na ruptura sem reserva com todos os partidos da colaboração com o imperialismo, pode levar as massas oprimidas à vitória. O laço que existe entre a burguesia nativa e os elemento feudal-reacionários permite aos imperialistas aproveitar muito bem a anarquia feudal, a rivalidade que reina entre os diversos clãs e tribos, o antagonismo entre a cidade e o campo, as lutas entre castas e seitas nacional-religiosas, para desorganizar o movimento popular (China, Pérsia, Curdistão, Mesopotâmia).
III
A questão agrária
Na maioria dos países orientais (Índia, Pérsia, Egito, Síria, Mesopotâmia) a questão agrária tem primordial importância na luta pela libertação do jugo do imperialismo metropolitano. Explorando e arruinando a maioria campesina dos países atrasados, o imperialismo a priva dos meios de vida fundamentais, enquanto que a indústria pouco desenvolvida, dispersa em diferentes lugares do país, é incapaz de absorver o excedente de população rural que, além disso, não pode sequer emigrar. Os camponeses pobres que permanecem em sua terra transformam-se em servos. Se nos países civilizados as crises industriais de pré-guerra cumpriam o rol de reguladores da produção social, nas colônias esse rol regulador é cumprido pelas penúrias.
O imperialismo, que tem interesse vital em receber a maior quantidade de benefício com a menor quantidade de gasto, mantém até sua última instância nos países atrasados, as formas feudais e usurárias de exploração de mão de obra. Em certos países, como por exemplo na Índia, atribui o monopólio pertencente ao Estado feudal-nativo, o usufruto das terras, e transforma o imposto da terra em uma renda que deve ser entregue ao capital metropolitano e seus comissionados, os “Zemindaram” e “talukdar”. Em outros países, o imperialismo se apodera da renda da terra, servindo-se para isto da organização nativa da grande propriedade da terra (Pérsia, Marrocos, Egito, etc).
Resulta disto que a luta pela supressão das barreiras e dos rendimentos feudais sobre as terras que ainda restam, apresentam o caráter de uma luta de emancipação nacional contra o imperialismo e a grande propriedade feudal da terra. Pode-se tomar como exemplo a sublevação dos moplahs contra os proprietários da terra e os ingleses no outono de 1921 na Índia, e o levante dos sijs, em 1922. Unicamente uma revolução agrária que tenha por objetivo a expropriação da grande propriedade feudal é capaz de sublevar as multidões campesinas e de adquirir uma influência decisiva na luta contra o imperialismo. Os nacionalistas burgueses têm medo das consignas agrárias, e as cerceiam tanto quanto podem (Índia, Pérsia, Egito), o que prova a estreita ligação que existe entre a burguesia nativa e a grande propriedade da terra, feudal e feudal-burguesa. Isto prova também que, ideológica e politicamente, os nacionalistas dependem da propriedade da terra. Estas dúvidas e incertezas devem ser utilizadas pelos elementos revolucionários para uma crítica sistemática e divulgadora do caráter híbrido da política dos dirigentes burgueses do movimento nacionalista. É precisamente esta política híbrida o que dificulta a organização e a coesão das massas trabalhadoras, como o prova o fracasso da tática de resistência passiva na Índia (não cooperação).
O movimento revolucionário nos países atrasados do Oriente somente pode ser coroado com o êxito se estiver baseado na ação das multidões campesinas. É por isso que os partidos revolucionários de todos os países orientais devem determinar claramente seu programa agrário e exigir a total supressão do feudalismo e suas sobrevivências, que encontram sua expressão na grande propriedade da terra e na isenção do imposto sobre a terra. A fim de uma participação ativa das massas campesinas na luta pela libertação nacional, é indispensável proclamar uma modificação radical do sistema de usufruto do solo. Ao mesmo tempo, é indispensável forçar os partidos burgueses nacionalistas a adotar a maior parte possível deste programa agrário revolucionário.
IV
O movimento operário no Oriente
O jovem movimento operário oriental é um produto do desenvolvimento do capitalismo nativo destes últimos tempos. Até o presente, a classe operária nativa, inclusive se se considera seu núcleo fundamental, está atravessando uma época transitória, caminhando da pequena oficina corporativa para a fábrica de grande tipo capitalista. Enquanto que os intelectuais nacionalistas burgueses arrastam a classe operária para dentro do movimento revolucionário para lutar contra o imperialismo, seus representantes assumem imediatamente um papel diretor na ação e na organização profissional embrionária.
No começo, a ação da classe operária não ultrapassa o marco dos interesses “comuns a todas as nações” de democracia burguesa (greves contra a burocracia e a administração imperialista na China e na Índia). Geralmente, como indicou o Segundo Congresso da Internacional Comunista, os representantes do nacionalismo burguês, explorando a autoridade moral e política da Rússia soviética e adaptando-se ao instinto de classe dos trabalhadores, embandeiram suas aspirações democrático-burguesas dentro do “socialismo” e do “comunismo” para assim desviar, por vezes sem se dar conta, os primeiros órgãos embrionários do proletariado de seus deveres de organização de classe (tal o Partido Berhill Ardou na Turquia, que repintou o pan-turquismo de vermelho, e o “socialismo de Estado” preconizado por certos representantes do Partido Kuo-Ming-Tang).
Apesar disto, o movimento profissional e político da classe operária dos países atrasados tem progredido muito nos últimos anos. A formação de partidos autônomos da classe proletária em quase todos os países orientais é um fato sintomático, embora a esmagadora maioria destes partidos deva fazer ainda um grande trabalho interior para libertar-se do espírito de gangue e de muitos outros defeitos. A Internacional Comunista apreciou em seu justo valor, desde o começo, a importância potencial do movimento operário no Oriente, e isto bem prova que os proletários do mundo inteiro estão unificados internacionalmente sob a bandeira do Comunismo. As Internacionais II e III/2 até o presente não encontraram partidários em nenhum dos países atrasados, devido a que estas internacionais se limitam a jogar um “papel auxiliar” diante do imperialismo europeu e norte-americano.
V
Os objetivos dos Partidos Comunistas orientais
Os nacionalistas burgueses apreciam o movimento operário de acordo com a importância que podem ter para sua vitória. O proletariado internacional aprecia o movimento operário oriental a partir do ponto de vista de seu futuro revolucionário. Sob o regime capitalista, os países atrasados não podem utilizar as conquistas da ciência e da cultura contemporânea sem pagar um enorme tributo à exploração e à opressão bárbaras do capital metropolitano. A aliança com os proletários dos países altamente civilizados lhes será vantajosa, não somente porque corresponde aos interesses de sua luta comum contra o imperialismo, mas também porque será depois de haver triunfado que o proletariado dos países civilizados poderá prestar aos trabalhadores do Oriente uma ajuda desinteressada para o desenvolvimento de suas forças produtivas atrasadas. A aliança com o proletariado ocidental abre o caminho para uma federação internacional de repúblicas soviéticas. O regime soviético oferece aos povos atrasados o meio mais simples para passar de suas condições elementares de existência para a alta cultura do Comunismo, o qual está destinado a suplantar na economia mundial o regime capitalista de produção e de repartição. O maior testemunho disto é a experiência da edificação soviética nas colônias libertadas do ex-império russo. Somente uma forma de administração soviética é capaz de assegurar o coroamento lógico da revolução agrária campesina. As condições específicas da economia agrícola em certas partes dos países orientais (irrigação artificial), mantidas antigamente por uma organização original de colaboração coletiva sobre uma base feudal e patriarcal e comprometida atualmente pela pirataria capitalista, exigem igualmente uma organização política capaz de satisfazer sistematicamente as necessidades sociais. Como consequência de condições climáticas, sociais e históricas particulares, corresponde ao Oriente em geral, no período transitório, um papel importante para a cooperação de pequenos produtores.
As tarefas objetivas da revolução colonial superam o marco da democracia burguesa. Com efeito, sua vitória decisiva é incompatível com o domínio do imperialismo mundial. De início, a burguesia nativa e os intelectuais nativos assumem o papel de pioneiros dos movimentos revolucionários coloniais, mas a partir do momento em que as massas proletárias e camponesas incorporam-se a tais movimentos, os elementos da grande burguesia e da burguesia latifundiária se apartam, deixando a iniciativa aos interesses sociais das camadas inferiores, do povo.  Uma longa luta, que durará toda uma época histórica, espera o jovem proletariado das colônias, luta contra a exploração imperialista e contra as classes dominantes nativas que aspiram monopolizar todos os benefícios do desenvolvimento industrial e intelectual e querem que as massas fiquem como no passado, em uma situação “pré-histórica”.
Esta luta pela influência sobre as massas camponesas deve preparar o proletariado nativo no rol da vanguarda política.
Apenas após ter sido submetido a este trabalho preparatório e após lhe terem sido submetidas as camadas sociais adjacentes, o proletariado nativo se encontrará preparado para enfrentar a democracia burguesa oriental, que tem uma característica de formalismo ainda mais hipócrita que a burguesia do ocidente.
A negativa dos comunistas das colônias em tomar parte na luta contra a opressão imperialista, sob o pretexto de “defesa” exclusiva dos interesses de classe, representa um oportunismo da pior qualidade e que não pode mais que desacreditar a revolução proletária no Oriente. Não menos nociva é a tentativa de manterem-se apartados da luta pelos interesses cotidianos e imediatos da classe trabalhadora, em uma “unificação nacional” ou uma “paz social” com os democratas burgueses. Duas tarefas, confundidas em apenas uma, correspondem aos partidos comunistas coloniais e semicoloniais: por um lado, lutar por uma solução radical dos problemas da revolução democrático-burguesa e que tenha por objetivo a conquista da independência política; por outro lado, organizar as massas operárias e camponesas para permitir-lhes lutar pelos interesses particulares de sua classe e utilizar com esse fim todas as contradições do regime democrático-burguês. Ao formular reivindicações sociais, estimulam e liberam a energia revolucionária que não encontrava nenhuma saída nas reivindicações liberais burguesas. A classe trabalhadora das colônias e semicolônias deve saber firmemente que a extensão e a intensificação da luta contra o jugo imperialista das metrópoles podem dar-lhe um rol diretor na revolução e que unicamente a organização econômica e política e a educação política da classe trabalhadora e dos elementos semiproletários podem aumentar a amplitude revolucionária do combate contra o imperialismo.
Os partidos comunistas dos países coloniais e semicoloniais do Oriente, que estão ainda em um estado mais ou menos embrionário, devem participar em todo movimento que seja apto a permitir-lhes acesso às massas. Mas devem levar uma luta enérgica contra os prejuízos patriarcal-corporativos e contra a influência burguesa nas organizações operárias para defender essas formas embrionárias de organizações profissionais, contra as tendências reformistas, e transformá-las em órgãos combativos das massas. Devem empregar todas as suas forças em organizar os numerosos jornaleiros e jornaleiros rurais, assim como os aprendizes de ambos os sexos, no terreno da defesa de seus interesses cotidianos.
VI
A Frente Única Anti-Imperialista
Nos países ocidentais que atravessam um período transitório caracterizado por uma acumulação organizada de forças, foi lançada a consigna de frente única proletária. Atualmente, nas colônias orientais, é indispensável lançar a consigna de frente única anti-imperialista. O oportuno desta consigna está condicionado pela perspectiva de uma luta a longo prazo contra o imperialismo mundial, luta que exige a mobilização de todas as forças revolucionárias. Esta luta é tão mais necessária devido às classes dirigentes nativas serem propensas a comprometerem-se com o capital estrangeiro, e seus compromissos atacarem os interesses primordiais das massas populares. Da mesma maneira que a consigna da frente única proletária no Ocidente contribuiu e ainda contribui para desmascarar a traição, por parte dos socialdemocratas, aos interesses do proletariado, a consigna da frente única anti-imperialista contribuirá também para desmascarar as dúvidas e incertezas dos diversos grupos do nacionalismo burguês. Por outro lado, esta consigna ajudará no desenvolvimento da vontade revolucionária e para o esclarecimento da consciência de classe dos trabalhadores, incitando-os a lutar na primeira fileira, não somente contra o imperialismo, mas também contra toda espécie de sobrevivência do feudalismo.
Antes de tudo, o movimento operário dos países coloniais e semicoloniais deve conquistar uma posição como fator revolucionário autônomo na frente anti-imperialista comum. Somente se se reconhece esta importante autonomia e se conserva sua plena independência política, são admissíveis e inclusive indispensáveis os acordos temporários com a democracia burguesa. O proletariado defende e desfralda reivindicações parciais, como por exemplo a república democrática independente, a concessão às mulheres dos direitos que não têm, etc, enquanto a correlação de forças que existe neste momento não permite colocar como tarefa imediata a realização de seu programa soviético. Ao mesmo tempo, busca lançar consignas suscetíveis de contribuição com a fusão política das massas camponesas e semiproletárias com o movimento operário. A frente única anti-imperialista está ligada indissoluvelmente com a orientação para a Rússia soviética.
Explicar às multidões trabalhadoras a necessidade de sua aliança com o proletariado internacional e com as repúblicas soviéticas é um dos principais pontos da tática anti-imperialista. A revolução colonial não pode triunfar a menos que seja junto com a revolução proletária nos países orientais.
O perigo de uma aliança entre o nacionalismo burguês e uma ou várias potências imperialistas hostis, em detrimento das massas populares, é muito menor nos países coloniais do que nos países semicoloniais (China, Pérsia) ou do que nos países que lutam por autonomia política explorando com esse efeito as rivalidades imperialistas (Turquia);
Embora reconhecendo que compromissos parciais e provisórios possam ser admissíveis e indispensáveis quando se trata de uma trégua durante a luta de emancipação revolucionária conduzida contra o imperialismo, a classe operária deve opor-se com intransigência a toda tentativa de partilha de poder entre o imperialismo e as classes dirigentes nativas, seja essa partilha feita abertamente ou de forma encoberta, pois tem por objetivo conservar os privilégios dos dirigentes. A reivindicação de uma aliança estreita com a República Proletária dos Sovietes é a bandeira da frente única anti-imperialista. Após tê-la elaborado, é necessário lutar decisivamente pela máxima democratização do regime político, para privar  de todo apoio os elementos social e politicamente mais reacionários e com o fim de assegurar aos trabalhadores a liberdade de organização que lhes permita lutar por seus interesses de classe (reivindicações da república democrática, reforma agrária, reforma dos impostos sobre a terra, organização de um aparato administrativo baseado sobre o princípio de um amplo governo próprio, legislação operária, proteção contra o trabalho infantil, proteção da maternidade, da infância, etc). Inclusive sobre o território da Turquia independente, a classe operária não goza da liberdade de coalizão, o que pode servir de índice característico da atitude adotada pelos nacionalistas burgueses a respeito do proletariado.
VII
As tarefas do proletariado nos países do Pacífico
Por outro lado, a necessidade de organização de uma frente anti-imperialista se dá pelo crescimento permanente e ininterrupto das rivalidades imperialistas. Essas rivalidades assumem atualmente tal agudeza que uma nova Guerra Mundial, em que o Oceano Pacífico seria o cenário, é inevitável caso a revolução internacional não a previna.
A Conferência de Washington foi uma tentativa de remediar esse perigo, mas na realidade não foi feito mais que aprofundar e exasperar as contradições do imperialismo. A luta que teve lugar recentemente entre Hu-Pel-Fu e Chan-So-Jin na China é a consequência direta do fracasso dos capitalismos japonês e anglo-americano para pôr em acordo seus interesses em Washington. A nova guerra que ameaça o mundo arrastará não apenas o Japão, a América e a Inglaterra, mas também as outras potências imperialistas, tais como França e Holanda, e tudo deixa prever que esta guerra será ainda mais devastadora que a de 1914-1918.
A tarefa dos partidos comunistas coloniais e semicoloniais dos países costeiros do Oceano Pacífico consiste em desenvolver uma enérgica propaganda, tendo por objetivo explicar às massas o perigo que as aguarda e chamá-las a uma luta ativa pela libertação nacional, além de insistir para que se orientem em direção à Rússia Soviética, apoio de todos os oprimidos e de todos os explorados.
Os partidos comunistas dos países imperialistas, tais como EUA, Japão, Inglaterra, Austrália e Canadá têm o dever, ante o perigo iminente, de não limitarem-se a uma propaganda contra a guerra, mas esforçar-se por todos os meios para descartar os fatores capazes de desorganizar o movimento operário destes países, como também os que facilitem a utilização pelos capitalistas dos antagonismos de nacionalidades e raças.
Estes fatores são: a questão da imigração e do mercado barato da mão de obra de cor.
O sistema de contrato é, até agora, o principal meio de recrutamento dos trabalhadores de cor para as plantações de cana de açúcar dos países do sul do Pacífico onde os trabalhadores são importados da China e da Índia. Este fato determinou que os operários dos países imperialistas exigissem que fossem postas em vigor leis que proíbam a imigração e o emprego da mão de obra de cor, isso tanto na América quanto na Austrália. Estas leis proibitivas agudizam o antagonismo que existe entre os trabalhadores brancos e os trabalhadores de cor, dividindo e debilitando a unidade do movimento operário.
Os partidos comunistas dos Estados Unidos, do Canadá e da Austrália devem empreender uma enérgica campanha contra as leis proibitivas e mostrar às massas proletárias destes países que tais leis, incitando as inimizades de raças, voltam-se no fim das contas contra os próprios trabalhadores dos países proibicionistas.
Por outro lado, os capitalistas suspendem as leis proibitivas para facilitar a imigração da mão de obra de cor, que trabalha a menor preço, para assim diminuir o salário dos trabalhadores brancos. Esta intenção manifesta dos capitalistas de passar à ofensiva pode ser desbaratada de maneira eficaz se os trabalhadores imigrados entrarem nos sindicatos onde estão organizados os trabalhadores brancos. Tal medida tomada pelos partidos comunistas desmascarará as intenções capitalistas e ao mesmo tempo mostrará com evidência aos trabalhadores de cor que o proletariado internacional está desprovido de preconceitos de raça.
Para levar a cabo as medidas indicadas anteriormente, os representantes do proletariado revolucionário dos países do Pacífico devem convocar uma conferência entre esses países, que elaborará a tática a seguir e encontrará as formas de organização para a edificação efetiva do proletariado de todas as raças dos países do Pacífico.
VIII
As tarefas coloniais dos partidos metropolitanos
A importância primordial do movimento revolucionário nas colônias para a revolução proletária internacional exige uma intensificação de sua ação nas colônias por parte dos partidos comunistas das potências imperialistas.
O imperialismo francês conta, para a repressão das forças da revolução proletária na França e na Europa, com os nativos das colônias que, segundo sua ideia, servirão de reserva para a contrarrevolução.
Como no passado, os imperialismos inglês e americano continuam dividindo o movimento operário e atraindo para o seu lado a aristocracia operária com a promessa de outorgar-lhe uma parte da mais-valia proveniente da exploração colonial.
Cada um dos partidos comunistas dos países que possuam um domínio colonial, deve encarregar-se de organizar sistematicamente uma ajuda material e moral ao movimento revolucionário operário das colônias. A todo custo é necessário combater inflexivelmente e sem trégua as tendências colonizadoras de certas categorias de trabalhadores europeus ultrapassados que trabalham nas colônias. Os trabalhadores comunistas europeus das colônias devem esforçar-se por agrupar os proletários nativos, ganhando sua confiança mediante reivindicações econômicas concretas (aumento dos salários nativos até o nível dos salários dos trabalhadores europeus, proteção do trabalho, etc.). A criação nas colônias (Egito e Argélia) de organizações comunistas europeias isoladas não é mais que uma forma mascarada da tendência colonizadora e ainda assegura os interesses imperialistas. Construir organizações comunistas segundo o princípio nacional é pôr-se em contradição com os princípios do internacionalismo proletário. Todos os partidos da I.C. devem explicar constantemente às multidões trabalhadoras a extrema importância da luta contra a dominação imperialista nos países atrasados. Os partidos comunistas que atuam nos países metropolitanos devem formar, ao lado de seus comitês diretores, comissões coloniais permanentes, que trabalharão para os fins indicados mais acima. A I.C. deve ajudar os partidos comunistas do Oriente, em primeiro lugar dando-lhes ajuda para a organização da imprensa, para a edição periódica de jornais redigidos nos idiomas locais. Particular atenção deve ser acordada para ação entre as organizações operárias europeias e entre as tropas de ocupação coloniais. Os partidos comunistas das metrópoles devem aproveitar todas as ocasiões que se lhes apresentem para denunciar o banditismo da política colonial de seus governos imperialistas, como também de seus partidos burgueses e reformistas.
Apresentado no Quarto Congresso da Internacional Comunista, 7 de novembro de 1922